Você tem um negócio ou apenas o produto?

Muitos engenheiros, tecnólogos e pesquisadores científicos embarcaram na onda da inovação nos últimos anos.

Alguns buscam em suas atividades apenas o avanço dos seus campos de conhecimento, outros com fins menos nobres e mais econômicos, querem se tornar empreendedores com suas invenções e descobertas.

A falta de visão de negócios, que só agora começa a ser ensinado nas universidades brasileiras, impede, muitas vezes uma percepção mais clara de que nem toda brilhante tecnologia pode se transformar em negócios lucrativos. A distância, muitas vezes, é enorme.

Para ilustrar o meu ponto, vou citar o caso de um aluno da pós graduação da Unicamp que me procurou há alguns anos com uma ideia muito boa. Ele havia desenvolvido uma tecnologia de captação de luz solar e transmissão via fibra ótica.

A aplicação, segundo ele, seria de instalar sua invenção no topo de edifícios e usar os cabos para iluminar aposentos do edifício sem janelas. O grande benefício seria, obviamente a economia de energia pelo uso maior de luz natural.

Ele queria ajuda para apresentar sua ideia para investidores em potencial. Eu elogiei sua ideia e perguntei se ele tinha um produto. Ele falou que aquele era o produto. Eu discordei e o desafiei a responder algumas questões para saber se ele tinha mesmo um produto:

• O produto é a placa coletora apenas? Junto com os cabos? E as lâmpadas especiais?
• Qual o alcance máximo dos cabos sem que haja perda da iluminação?
• Quantos cabos são necessários para iluminar um aposento de 5 m²?
• Pode ser instalado em prédios já construídos ou os cabos só podem ser colocados na obra?
• Qual é a janela de horário diurno para obter o maior índice de eficiência?
• Quanto de espaço ocupam as placas coletoras no teto para cada aposento?
• Como funcionarão os interruptores? Como faço para ‘desligar’ a luz?

Embora ele não tivesse respostas para estas perguntas, demonstrando que ele tinha a tecnologia, mas não o produto, eu não discordei quando me falou que não seria difícil conseguir estas respostas após alguns testes e simulações.

Então eu perguntei se ele tinha um negócio. Já me antecipando à sua resposta, disse a ele que, mesmo que tivesse um produto, ainda precisaria pensar no negócio. Diante de sua cara de interrogação, fiz mais uma bateria de perguntas:

• Qual é o público-alvo deste produto? Construtoras, empresas de iluminação, pessoa física?
• Qual o principal apelo de valor? Ecológico/ambiental, econômico, prestação de serviço?
• Qual é o custo de produção, incluindo matéria prima, processo produtivo, estocagem, transporte e implantação?
• Quanto este público está disposto a pagar? Cobriria os custos mínimos?
• Onde seria distribuído? Nas metrópoles, mercado externo, só em São Paulo?
• Como seria a assistência técnica? Própria, terceirizada, especializada?
• Quais matérias primas são necessárias? É abundante? Existem fornecedores suficientes?
• Onde conseguir mão-de-obra especializada? Qual o investimento para formar uma boa equipe?

Ele ficou pasmo. Claro que não tinha ideia de nada disso, mas se comprometeu a levantar estas informações. Eu disse que ele até poderia ter um negócio, mas estas informações não indicavam se este negócio seria viável.

Foi aí então que eu dei a cartada final, o divisor de águas entre os que desistem e os que persistem e se tornam empreendedores. Esta foi a bateria final de perguntas:

• Qual a necessidade de investimento inicial total para instalar a fábrica e o modelo de distribuição?
• Como se comportarão as receitas ao longo dos próximos 5 anos?
• Qual seria a sua estratégia de entrada e depois como faria para crescer?
• Qual é o volume mínimo de vendas a atingir para cobrir a totalidade dos custos e despesas?
• Quanto tempo levaria para recuperar o investimento feito?
• Quando o negócio se tornaria lucrativo?

Antes que ele desanimasse de vez, avisei que nada disso era importante, ele não iria conseguir estas informações e que a maioria dos negócios bem sucedidos nunca teve este tipo de dado antes de abrir e confessei que na verdade apenas estava testando ele.

Por fim, disse que ele iria ter um negócio lucrativo, mas para isso, ele tinha que pensar no próximo passo ainda e o próximo passo não é buscar um investidor e sim fazer um protótipo e testar em um ambiente real. O próximo passo é ter um produto.

Quando ele falou que só iria investir mais tempo neste projeto se soubesse de antemão que o projeto seria lucrativo, pensei um pouco e disse para ele:

Se você precisa de um plano de negócio para se convencer que a ideia é boa, então pode desistir agora. O plano de negócio serve para convencer os outros. O empreendedor ‘sabe’ quando sua ideia é boa.

Primeiro veja se você tem um produto. Depois veja se você tem um negócio. Quando você responder a segunda bateria de perguntas, não precisará responder a terceira.

Não sei o que aconteceu com ele. Pode ter desistido de cara, pode ter insistido mais um pouco ou pode ter se tornado um grande empreendedor. Só sei que ele representa um dos milhares de técnicos que acham que ter um bom produto, e não só a tecnologia, é suficiente para ter um bom negócio.

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Marcos Hashimoto